terça-feira, 22 de setembro de 2009


Artigo.

A nau dos desperdicidores.


por Marlon Marques.





































Que estupidez. Acho que isso é o que posso dizer sobre o que vi nessa semana que passou. Olha que quando eu acho que o ser humano chegou no limite do limite, aí é que eu percebo que ainda falta muito para esse limite chegar. Em Nova York, mais de 250 pessoas se reuniram para uma enorme guerra de tortas. O motivo e meta era a quebra do recorde mundial e entrar para o também ridículo Guinness Book. Não sei ao certo quanto se gastou para fazer tantas tortas assim, afinal, uma guerra dessa proporção não se faz com apenas 250 tortas, ou seja, 1 torta por pessoa. Muitas tortas foram feitas para tal evento. Se chutarmos alto, colocando 5 tortas por pessoas, multiplicando isso, dará 1250 tortas. Se pensar bem, isso não é muito, mas se pensar na quantidade de farinha, ovo, e outros ingredientes, aí sim se tem a proporção exata do desperdício. Só falamos do desperdício de energia e de água, mas e o desperdício de comida? Quantas pessoas não morrem de fome na África por ano? E nos outros continentes? Países como Zâmbia, Etiópia, Índia, Timor Leste, tornaram-se símbolos, arquétipos da fome no mundo, isso sem contar o nordeste brasileiro. Agora pensando por esse lado, não seria mais proveitoso usar todo esse material utilizado nas tortas em doação aos famintos? Talvez não fosse matar a fome do mundo, ou da África, ou da Tanzânia, ou de qualquer cidade do globo terrestre, mas seria com certeza muito mais proveitoso. É típico do capitalismo esse tipo de atitude. Francis Fukuyama no seu polêmico livro “O Fim da História e o último homem”, diz que o capitalismo foi [e é] o único modo de produção [não que ele use esse termo] capaz de proporcionar ao homem a supressão de suas necessidades básicas dando-o condições de realizar suas necessidades secundárias sem que elas comprometam as básicas. Isso quer dizer que o homem do capitalismo é inescrupuloso. Pois como se sentir bem recebendo e dando tortadas, enquanto que em outra parte do mundo, ou até mesmo na casa ao lado da sua alguém passa fome? O sistema faz o egoísmo ser a condição. O preço médio de um pedaço de torta de chocolate em qualquer doçaria é 10 reais, sendo que os mesmos 10 reais, equivalem a uma refeição completa em restaurantes comuns de pratos feitos. O que enche mais a barriga, uma suculenta torta de chocolate ou arroz, feijão, batata frita e um bife bem passado? Um insensato talvez diria, “o é que é um prato de comida em um dia, para quem passa um ano com fome?”, eu digo, muita coisa. O que é digno, ganhar 1 real trabalhando ou 1 milhão roubando? É paradoxal. O fato é que a mesquinhez do mundo não permite que pelo menos respeitemos a dificuldade do outro. No Brasil é muito assim, o luxo convive muito próximo da pobreza extrema. Não é uma questão de segregar ou de reprimir, mas é bom senso. Qual a razão de um garoto de classe alta que mora num belo condomínio ficar passeando de roupas de grife perto da favela? Já que você tem e não divide, pelo menos não esbanje, não humilhe o outro que não tem, não torne a vida dele mais difícil do que já é. É como diz o ditado, “o que os olhos não vêem, o coração não sente”. Quantas e quantas toneladas de comida vão para o lixo todos os dias que ainda tinham condições ir a mesa de qualquer pessoa? Portanto é e deve ser sempre condenável qualquer atitude desse tipo. E o pior é a cara de satisfação das pessoas ao jogarem uns nos outros as tortas. Muitos morangos voando, muitos outros caindo e sendo pisoteados, cascatas de chantili, chuvas de glacê. Uma verdadeira orgia de desperdício e banalidade. O chão estava coberto de torta, da mesma forma que no carnaval o chão fica recoberto de papel picado e confete. Cabe aqui um ponto de reflexão sobre o que cada um pode fazer em relação a minimização do desperdício. O videoclipe da canção “Sing” do grupo britânico Travis, nos dá uma noção muito exata do quanto se perde com guerras de comida, e do quanto guerras de comida são inuteis e banais. Nossa mudança de atitude não mudará a vida de ninguém, porém é horrível saber que enquanto muita gente passa fome há gente desperdiçando comida. Mas como já nos disse o grande Aristófanes, “a juventude envelhece, a imaturidade é superada, a ignorância pode ser educada e a embriaguez passa, mas a estupidez dura para sempre”.



















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