segunda-feira, 13 de setembro de 2010


Artigo.

Futebol, Pierre Boudieu e a verdade por trás das coisas.



por Marlon Marques.

























Em uma das cenas no meio do filme “O Gênio Indomável” de Gus Van Sant, quatro amigos caminham pela rua conversando e um deles diz: “reestruturação, é uma palavra que criaram para mandar você embora”. Na época eu não sabia, mas anos depois eu descobri que essa frase foi extraída de uma teoria de Pierre Bourdieu. A teoria diz que as empresas camuflam certas expressões dando a elas ambigüidade – fazendo com que as pessoas se enganem. Se a empresa não te quer mais, o certo seria dispensá-lo e dizer a verdade, mas não, dizem que ou estão “enxugando” o orçamento, ou a empresa está passando por um processo de reestruturação ou ainda mudança de perfil. Bourdieu ainda estendeu a teoria para os meios de comunicação, dizendo que muitas notícias são manipuladas – vide acusações contra a tevê Globo e revista Veja. Porém o sociólogo francês não imaginava que sua teoria também atingiria o futebol. A ética jornalística – e as escolas de comunicação – pregam a isenção e a imparcialidade no exercício da profissão jornalista, mas na prática não é o que vemos. No caso da editoria de esportes – e do futebol em específico, o que se vê é muito “bairrismo” e muita paixão clubística. Se o comentarista torce para o time A, todos os seus comentários serão favoráveis e tendenciosos ao time A, o mesmo faz o comentarista do time B, etc. A imprensa sempre se vangloriou de sua postura crítica, entretanto boa parte dela, “blinda” certos jogadores em troca de preferências ou qualquer outra coisa. Porque é então que muitas emissoras reclamaram que o Ronaldo dava exclusividade para a Globo? Por uma simples razão – ninguém nessa emissora critica o Ronaldo em nenhuma situação. Ronaldo e Rogério Ceni não são unanimidades no país – há muita gente que não gosta. Mas na imprensa não, são os dois jogadores mais adorados e protegidos – acima de críticas – e isso vale também para os clubes que jogam. Através da teoria de Bourdieu, veremos aqui como as coisas funcionam realmente e o que há por trás de certas expressões. Antes do futebol veja como isso se espalha para a sociedade. O ex-cantor Rafael Ilha por conta de seu envolvimento com drogas, é tratado como dependente químico e doente, o pobre é drogado e safado. O estilista Ronaldo Esper e a atriz Winona Ryder quando foram pegos roubando objetos, foram chamados de cleptomaníacos, o pobre é “ladrão” e “bandido”. No mundo do futebol há essas inversões também. Qualquer time que ganha um jogo apertado, no finalzinho, a imprensa diz: foi na bacia das almas, tomou um sufoco – quando é o Corinthians: timão vence do jeito que a fiel gosta. Qualquer time começa mal o campeonato, vence três partidas seguidas e sobe na tabela, a imprensa diz: fogo de palha, cavalo paraguaio – quando é o São Paulo: “o campeão voltou”. Quando o goleiro Fábio Costa jogava no Santos a imprensa dizia: desequilibrado, sem cabeça e muito instável – quando foi para o Corinthians: “muralha do parque São Jorge”. Quando o Dagoberto do São Paulo divide as bolas por cima, com a sola da chuteira a imprensa diz: está se protegendo, isso é malandragem – quando é o zagueiro Domingos: criminoso, maldoso, tinha que ser preso. Isso é ou não é dar tratamento diferente? No jogo contra o Avaí, o atacante Neymar foi acusado de humilhar os adversários por referências a dinheiro, altos salários e por ser milionário e eles não. No campeonato paulista de 2009, num jogo contra a Ponte Preta, Ronaldo foi acusado de fazer o mesmo – disse o craque (segundo a acusação) ao um pontepretano no chão: “levanta logo e vai jogar, porque eu não preciso disso, pois já sou milionário e consagrado, você não”. O Neymar foi execrado pela mídia e chamado de arrogante (e que se realmente fez isso é mesmo) – o Ronaldo não. Os poucos que falaram a respeito minimizaram, disseram que é do jogo mesmo e que isso faz parte. Quando marcam forte e em cima o Ronaldo não pode, quando é o Neymar e o Kleber pode porque são cai cai. Na final do campeonato paulista de 2010 entre Santos e Santo André – o meia Paulo Henrique Ganso se recusou a sair de campo quando o técnico Dorival Júnior ia substituí-lo. A imprensa disse que o Ganso cometeu uma insubordinação, que o Dorival Júnior era um técnico sem pulso e o Santos um time sem comando. Quando o Rogério Ceni mandou os jogadores se aquecerem e ordenou a substituição, a imprensa tratou diferente. Chamou o Rogério Ceni de líder nato, o técnico Sergio Baresi de humilde, pois aceitou a colaboração e o São Paulo de um time moderno, unido, onde todos colaboram. Em 2006 – após o São Paulo ter perdido a Recopa Sul-americana para o Boca Juniors, Rogério Ceni jogou sua medalha para a torcida, num claro gesto anti-desportivo. A imprensa disse: jogador de brio, não aceita jamais perde porque é um vencedor nato, um guerreiro. Se fosse qualquer outro jogador – menos o Ronaldo, seria tratado como um ignorante que não sabe perder, que não tem far play, espírito esportivo, etc. Não se discute aqui as qualidades desses dois grandes jogadores – estão inclusive numa seleta lista dos melhores de todos os tempos, mas é fato que são protegidos pela imprensa. A imprensa não pode cobrar seriedade do esporte que ela mesma cobre sem. É preciso analise crítica, não importando camisa, torcida e nome de jogador. Abaixo esse discurso falso, a essa falsa ética – e principalmente a bajulação desnecessária com Ronaldo e Rogério Ceni – e ainda por cima a imprensa daqui critica a imprensa argentina pelo endeusamento de Maradona. Pois parte da credibilidade que o futebol perdeu só poderá ser reconquistada, quando tivermos uma imprensa mais equilibrada, menos apaixonada e mais crítica – mesmo que isso fira ídolos e corações – a Deus o que é de Deus, e a César o que é de César.




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2 comentários:

  1. Júnior2:49 PM

    Você criticou algo mas agiu da mesmíssima forma que disse que a imprensa age.
    Ficou claro que você é santista. A imprensa inteira endeusou o time do Santos o 1º semestre inteiro, vi a maioria aplaudindo a atitude do Ganso e não vi ninguém falando em insubordinação.
    É fato que existia mesmo, pois o tal Neymar conseguiu colocar pra fora do clube um grande profissional que é o Dorival.

    O fato é que nunca a imprensa será totalmente imparcial. Quem torce pra algum time sempre lutará coração x razão. Não adianta isso. Seu post foi claro nesse sentido, você reclamando de SPFC e Corinthians...

    Da mesma forma que esses dois clubes são "protegidos", são atacados. Qualquer notícia seja ruim o boa nesses clubes, chamará mais atenção e a imprensa usa isso. Você também é imparcial.

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  2. Anônimo9:21 PM

    Poxa, comentário interessante! Digo isso sinceramente Júnior, já que muitas pessoas que postam comentários aqui, na maioria das vezes prefere ofender.

    Sim, sou santista – mas consigo “estar” neutro muitas vezes, basta ver que já escrevi enaltecendo outros clubes, e enxergo qualidades nos outros também. Não concordo que a imprensa inteira endeusou o time do Santos, uma parte sim, toda não. E outra, o time que jogava o futebol mais bonito, logo dava audiência e a imprensa vive disso não? O quê, muitos (não todos) criticaram o Ganso sim, e o fato só foi abafado por conta do título. E se existia (ou existe) insubordinação no Santos, o que dizer então do São Paulo – o time modelo? Ao falar do Neymar acho que teremos que pôr aspas aí: uma coisa é o jogador, outra é a pessoa dele. O jogador é fora de série – mas como é do Santos sempre há quem bote defeito e até considere o Dentinho similar – só porque é do Corinthians. A pessoa Neymar – é fruto e reflexo da juventude de hoje, mal educada, mal formada, desinformada, mimada, entre outras coisas e eu não cego (mesmo sendo santista) e critico – como critiquei as atitudes do Neymar.

    A questão não é que “a imprensa nunca será totalmente imparcial” – mas sim que ela é demasiadamente parcial, e isso prejudica a análise. E esse conflito existe sim (razão x coração), mas porque não com gente do calibre de um Claudio Zaidan, Paulo Calçade, entre outros? E não reclamo do time “x” ou do time “y” – sim do fato de que tudo relacionado a esses clubes seja melhor. O Chico Lang teve a capacidade de dizer que o Corinthians foi o primeiro clube realmente grande que o Mano Menezes treinou – será que ele não conhece um time chamado Grêmio de Foot-Ball Porto Alegrense?

    Eu acredito (mesmo sabendo que a realidade não é essa) em imprensa séria, por isso que poucos teem minha atenção ou voto de credibilidade. Se fossem sérios não teriam que “proteger” certos clubes, porque lugar de torcer é na arquibancada ou no sofá de casa, imprensa é lugar de seriedade.

    Marlon Marques.

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