sábado, 6 de junho de 2009

Dossiê Caetano Veloso.



























Crítica.

Caetano Veloso - Estrangeiro.


por Marlon Marques.

Quando “Estrangeiro” foi lançado [1989] eu tinha apenas cinco anos de idade, e foi somente 11 anos depois, que tomei contato com essa grande obra da música brasileira. Tomei emprestado de um amigo [Gaga] uma coletânea de Caetano Veloso da série Millennium, um disco bastante variado, com canções de várias fases do compositor. E por incrível que pareça, entre as algumas músicas do qual não gostei, estavão justamente “O Estrangeiro” e “Raí de Cores”, ambas desse disco. Não gostei por não ter ouvido direito, e também por não ter compreendido direito, não tinha à epóca repertório para entender tamanha complexidade. É isso o que posso dizer desse álbum, complexo, e também de vanguarda. Caetano reuniu um time de primeira para fazer esse disco, só grandes músicos, nacionais e internacionais, gente como Naná Vasconcelos, Carlinhos Brown e Tavinho Fialho; Arto Lindsay, Bill Frisell e Marc Ribot. Embora no disco haja “Meia-lua Inteira”, Estrangeiro é muito distante da MPB tradicional, aquela esquema fácil que costumamos ouvir na Nova Brasil FM, é um disco a frente. Caetano fecha a década de 80 com um disco primoroso, um disco muito bem tocado, bem arranjado e bem produzido, com letras ora hermérticas demais, ora poéticas demais, mas sempre caetânicas. Hoje a impressão que tenho é que Estrangeiro deveria ser mais lembrado [e tocado], deveria não, deve, pois há ali versos poderosos, que significam muito, além da riqueza musical, e da alta técnica envolvida em cada acorde, em cada minuto de música desse belo tratado de beleza. “O Estrangeiro” é uma grande canção, o próprio Caetano declarou em 91, de fato. Trata a beleza como algo subjetivo e conjuntural, pois de nada adianta a praia de Botafogo ser bela mas ao mesmo tempo poluída [uma visão baseada em Simmel], o amor é cego, é dual, a Baía de Guanabara é bela e banguela ao mesmo tempo. “Raí de Cores” é uma continuidade de “Trem das Cores”, claro que em um outro sentido, mais abstrato, é quase um fusão entre Seurat e Pollock. “Branquinha” é uma canção de amor feita para Paula Lavigne, sua mulher na época, hoje sua empresária e ex-mulher. É uma linda música, aquela batida típica no violão e a voz suave e puchadissima de Caetano em frases como “carnação da canção que compus“, ou “vou contra a via, canto contra a melodia, nado contra a maré. Que é que tu vê, que é que tu quer, tu que é tão rainha”. Essas duas últimas inspiradas em pessoas, em Paula Lavigne e em Tônia Carreiro, Caetano disse ter visto uma entrevista com a atriz [Tônia] e perguntaram a ela qual a sua cor preferida, então teve a idéia para Raí de Cores, "qual são as cores, que são suas cores de predileção". Há também uma homenagem e uma canção que não é de sua autoria. A homenagem é para o seu grande ídolo, João Gilberto em "Outro Retrato". O som é bem tropical [não tropicalista], diria ser um certo “suingue de vanguarda”, exagero, talvez, mas o fato é que a canção é simples, a letra diz apenas que João o influenciou tanto poética quanto musicalmente falando, mesmo esse [João Gilberto] não gostando nem de música, nem de poesia. “Meia-lua Inteira” é de Carlinhos Brown, que deve muito a Caetano Veloso, mas tem seus méritos também diga-se de passagem, é a mais MPBzona do disco. É pop, é de rádio e foi trilha de novela da globo [Tieta], quer mais. É boa e dançante, tem um dado de Bahia muito forte, talvez antecipando o disco “Livro” em certo sentido. “Jasper” é cantada em inglês, tem um toque futurista, é climática, lembra muito o trabalho de Andy Summers e coisas do próprio Bill Frisell, batidas eletrônicas secas [no molde do Kraftwerk e do New Order], percursão brasileira e um pouco de jazz rock. “ETC.” é também um canção bem MPB, no mesmo esquema, violão, voz, arranjo minimal, já “Este Amor” segue a linha de Jasper. Uma canção com ritmo moderno, lento, arranjo diferente do que se estava acostumado no Brasil na década de 80 – por isso chamei de som de vanguarda – uma mistura de ritmos, não uma fusão, pois tanto os elementos de fora quanto os de dentro não criam algo novo, não somem, apenas convivem juntos. “Genipapo Absoluto” também é uma canção bela, violão simples acompanhado por uma colcha de efeitos e pequenos ruídos, onde repousa uma letra poética e hermética ao mesmo tempo, a mesma dualidade de O Estrangeiro, uma anti-dialética, que é o permeia o disco como um todo. A grande música do disco junto com O Estrangeiro é “Os Outros Românticos”. Um som cheio de nunças, um ritmo com pé na África [umas batidas meio tribais], ecos de guitarra de Arto Lindsay e os climas do teclado de Peter Sherer. A letra corrobora com o apocalipse da música, ambas dualmente se completam. É um retrato cantado do fim de uma década, não apenas, do fim de uma era, que cai simbólicamente com o muro de Berlim, lançando para o futuro novas utopias e nos reservando novas incertezas também.












































Caetano Veloso - Estrangeiro [Polygram, 1989]

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Artigo.

Os Outros Românticos.


por Ladislau Smack & Marlon Marques.











































Quem eram os “outros românticos”? Aventureiros que atravessaram todo o século XX – e que subexistem ainda. Sabemos que os seres humanos, imperfeitos que são, querem ser nivelados por cima, e a igualdade é um discurso bonito, mas vão. A revolução francesa mostrou que o romantismo dos ideais de igualdade foram por terra – os Estados Unidos confirmaram que na terra da liberdade a igualdade é apenas uma palavra, que morreu com Luther King em 68, e que talvez respire com Obama. O socialismo foi uma alternativa tão letal e insustentável quanto o capitalismo o é, a diferença é que o socialismo nivelou as pessoas por baixo. Se mostrou retrógrado e se mostra ainda em Cuba – o que demonstra a ambivalência presente nos seres humanos – líderes vivendo na caverna de Platão, no escuro. Nas trevas de uma Idade Média contemporânea, obscurantista, sai a igreja entra o partido, sai o dógma da infalibilidade papal, entra o da infalibilidade do dirigente do partido. A forma como a União Soviética foi conduzida, não conseguiu manter a competição em igualdade de condições com o Estados Unidos. A corrida armamentista e tecnológica se manteve equilibrada a maior parte do tempo, porém divergências ideológicas e políticas – principalmente com a divulgação dos escândalos de Stálin – fizeram com que a União Soviética ruísse, politica e economicamente. Não foram capazes de acompanhar as transformações mundiais, a quase invisível [à época] globalização que integrava cada vez mais as nações, mesmo as nações inimigas. O capitalismo não é ético, trai seus próprios princípios doutrinários e ideológicos, pois a pregação dos papas Milton Friedman e Friedrich Hayek de auto-regulação é suplantada em momentos de necessidade – veja hoje o quanto o governo Obama interfere [quase comanda] nos assuntos econômicos do país. O socialismo é ético por não trair seus ideais, e o preço que pagou para se manter ético, foi justamente a existência do próprio sistema. O socialismo não foi capaz de acompanhar essa Babel de economias, essa enxurrada de idéias e teorias econômicas, conceitos por vezes abstratos demais para um público médio que assiste atônito no noticiário todo esse repertório de informações. O socialismo pregou um sistema sem Deus. Porém se tornou um sistem com e sem um Deus, pois o Deus judaico-cristão foi substítuido por um panteão de deuses, o Zeus Karl Marx, Lênin, Trotsky, Stálin, Fidél e o martír que andava no meio dos humildes, morreu pela justiça e era barbudo, Che Guevara. O socialismo tornou-se uma religião, os sectários e simpatizantes [companheiros] os fiéis, as internacionais os cultos, o mesmo caminho cego da religião espiritual foi seguido pela religião material. Caetano Veloso traz a discussão para o Brasil e suas contradições, que acompanhando as transformações mundiais, saia de uma Idade Média [ditadura militar] mas mantinha-se em outra, os trinta milhões de meninos abandonados, crescendo e tornando-se homens – que reproduzirão e aumentarão o número de abandonados no país. Caetano aponta para um futuro do futuro, que desde pelo menos Maurício de Nassau aponta o Brasil como o país do futuro. Assim como a música [instrumental], a letra aponta para um futuro obscuro, apocaliptíco, visto nos vitrais compostos por toda essa gama de situações internadas conjuminadas com a globalização – todos sofreram com as consequências do queda do muro de Berlim. Caetano é cético e prático, aponta para apocalipses totais [falta de esperança] e para utopias radicais [esperança], enquadrada talvez numa chave de análise que vislumbra uma ressurreição do sonho socialista num futuro no futuro. O presente em 1989 era incerto, principalmente para a Alemanha. O Brasil também vivia a expectativa da retomada da democracia e das possibilidades de um projeto de Brasil mais igualitário, porém alinhado com a nova [des]ordem mundial. O futuro mostrou o efeito dominó da queda do muro, dois anos mais tarde desentegra-se a União Soviética, dos seus destroços as ex-repúblicas caminharam lentamente para o capitalismo, assim como a Alemanha unificada e a própria Rússia. Essa transformação não era prevista pela vanguarda alemã à partir da década de 60 e 70, as bandas de rock alemão, com base no Krautrock, vislumbravam uma mudança justamente contra os valores dominantes anglo-americanos. Hoje podemos situar como “novos românticos”, ou novos utópicos, filmes como Edukators, Adeus Lênin! e As Invasões Bárbaras, pois posicioanam-se como críticos a situação [do processo da mudança citado acima], vislumbram saídas radicais, utopias radicais. Nutrem a rebeldia e a revolução, com vigor, o mesmo vigor repressivo da violência dominante no Brasil, violência social, política, econômica e policial. A brado desse cinema radical é tão truculento quanto o grito das bandas alemãs e tão estridente quanto o grito de morte de Pixote. Os anjos sobre Berlim [do filme Asas do Desejo de Wim Wenders] representam a escolha entre um mundo e outro em uma cidade dividida, o dilema da resistência ou da entrega, da luta ou da renúncia, do manter a utopia ou do ser morto por ela. O mundo desde o fim [Antônio Cícero] é apenas uma licença poética, o mundo da perspectiva de seu fim, representando a idéia de transição, de um mundo para outro mundo, que Caetano confirma, “e no entanto era um sim”, era um fim do mundo sim. E não nos enganemos, um mundo acabou, deixou de existir, mas não foi dominado por um mundo melhor, nada mudou estruturalmente, pois o capitalismo não consegue atender as necessidades do mundo e se adequar dentro dos padrões do aceitável [pois se adapta, não de maneira sustentável]. E esse fim parece o destino último desse futuro tão mencionado. E se no entanto era um fim sim, “e foi, e era e é e será sim”, ou seja, foi um fim [fato consumado], era um fim [o processo] e será um fim, prenúncio de um vitral apocaliptíco projetado num futuro.

























































































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Ensaio.

Uma ironia sexista.


por Dirce Dalila & Cremilda Batista.



























Será que o Caetano virou um sexista. Logo ele, um homem tão orgulhoso de sua condição crítica e pós-moderna. Provavelmente a canção “Homem”, nona faixa do álbum Cê, deva ser uma brincadeira de mau gosto, uma ironia, acredito não se referir a visão de Caetano sobre as mulheres. Para alguém que um dia cantou “que a tigresa possa mais do que o leão”, soa até surpreendente acreditar ao contrário. Só que por outro lado, a expressão “eu sou homem”, é dúbia. Pode-se referir a uma mera questão de genêro, distintiva entre homem e mulher, ou uma certa auto-afirmação de Caetano quanto a sua sexualidade. Apesar que pode ser de fato uma ironia, uma provocação, assim como “ele me deu um beijo na boca”, ou “mas retribuo a piscadela do garoto de frete do Trianon, eu sei o que é bom”. Entretanto, mesmo que irônica, a letra é ofensiva, é simples, mas vai direto ao ponto, e cai em estereótipos. Fica mesmo a dúvida se Caetano se auto representa na canção, ou se representa a classe do macho, como ele cita em “O Estrangeiro”, o macho adulto branco sempre no comando. Pelo que conheço de Caetano trata-se mesmo de uma ironia, de um choque apenas, li muitas entrevistas suas e não há nenhum indício de sexismo [ou misoginia] em seu pensamento. Até porque iria contradizer parte de sua retórica, desde sua grande expansão pós-tropicalista. Caetano também é muito fã de Gal, Bethânia e de Dona Canô, sua mãe, ele em geral fala muito bem das mulheres, esse é mais um indício da ironia. O homem geralmente não inveja a mulher, essa relação de inveja se dá normalmente entre as próprias mulheres – será a face ambigua de Caetano se revelando, tal qual camaleão como Bowie? As mulheres não querem ser invejadas, e nem precisam disso, o que não se inveja nas mulheres são características que elas próprias despresam em si. Principalmente a mestruação, é horrível. A lactação não é ruim, mas é injusta, pois o homem também deveria amamentar o bebê – pois a cria é tanto da mãe, quanto do pai. Mas a inveja da longevidade dps orgasmos múltiplos é até óbvia, pois é só no prazer que as coisas se dão para o macho, uma visão epicurista da vida. A maternidade também é ambigua, tem um lado bom e outro ruim. É por um lado maldição e por outro redenção, pois é a suprema afirmação da feminilidade [no âmbito do genêro] – as feministas de plantão podem se irritar – e maldição no sentido teológico, pois na queda, Eva foi condenada a sentir as dores do parto. A intuição é outra ofensa grave as mulheres. Homens quando fazem algo bom, ou alguma descoberta, é sempre atribuido ao raciocínio e ao intelecto, agora as mulheres quando fazem algo notável, é sempre atribuido a intuição feminina. Será que Jane Austen ou Virginia Woolf quando escreveram seus grandes romances, o fizeram intuitivamente? Será que Marie Curie ganhou dois prêmios Nobel por intuição? Difícil. Pelo visto não há homens gordos, só mulheres. É bom reparmos que cresce cada vez mais o número de homens em academias, ou fazendo dietas, cuidando do corpo em geral, os metrosexuais. Ou seja, não são apenas as mulheres que são adiposas, homens também o são, e Susan Boyle está aí para comprovar o valor das cheinhas – para usar mais um termo horrível, tanto quanto, bonitinha. Uma das grandes verdades já faladas até hoje é a de que “o cinema cria mitos”. Os filmes “noir” criaram o mito da mulher fatal – de Mata Hari à Marilyn Monroe – e essa caracterização se estendeu a todas as mulheres e chega até o século XXI. Sagacidade e dissimulação não podem ser atributos universais das mulheres, de algumas mulheres sim, de todas não. Sabemos que muitas mulheres em empresas ou em governos se promovem a custa do teste do sofá, mas há muitas mulheres que chegaram [e chegam] lá [não no que você está pensando] não por esses meios. E definitivamente não acho que as mulheres são mais fiéis do que os homens. Acho que algumas mulheres chegaram num tal ponto de igualdade com os homens, que não se importam mais com o status social, ou com a má fama no bairro. Traem mesmo seus parceiros, sem dó ou culpa nenhuma. Hoje existem poucas donzelas como a de “Com açucar, com afeto” de Chico Buarque, há mais donas Norminhas da novela Caminho das Índias, boas moças em casa e liberais fora dela. O conceito de igualdade pressupõe igualdade em tudo, até em questões éticas como essa. Não apenas salários iguais que as mulheres querem, querem igualdade de direitos e nos lares, até uma visão igualitária do ponto de vista religioso – um instrumento poderoso nas mãos dos homens. Agora pergunte as mulheres hormonalmente desequilibradas se elas sentem inveja dos pêlos grossos no nariz, ou em qualquer outra parte do corpo? E também pergunte as feministas se elas sentem inveja do pênis, eu acho que não – Freud que me desculpe.





















































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