sábado, 3 de outubro de 2009


Artigo.

O rock não morreu, mas agoniza.


por Marlon Marques.














































Essa expressão é de fato um grande clichê. Porém igual clichê é a expressão contrária, a de que o rock não morreu. Embora a expressão seja mais alegórica do que real, o fato é que o rock não morreu, mas está muito, mas, muito doente. Não sei se é câncer ou H.I.V., mas é grave, e não temos em vista uma cura para essa doença. É contagiosa sim, e mata em poucos meses. Eu já fiquei pasmo quando ouvi que o Strokes era a grande salvação do rock, um ano depois ouvi a mesma coisa do Arctic Monkeys. Conclui então que o Strokes não foi capaz de salvar o rock, e pelo jeito o Arctic Monkeys também não. O problema é que as novas bandas são extremistas. Ou você copia fórmulas antigas, ou tenta ser tão original que fica chato e parecido com nada. A música, assim com a arte em todas as suas formas, é um processo natural. É como aquele mito de que nos anos sessenta bastava usar LCD para criar músicas geniais. Claro que não, bastava ter talento e competência, as drogas eram secundárias nesse processo. O rock hoje vive muito mais da promoção, das novas mídias e do visual. No exterior [e depois no Brasil] de repente todo mundo usa all star sujo, calça agarrada e cabelo cheio e despenteado, como que na crença de que isso bastara para fazer um bom disco, com atitude. Quantas bandas não são assim? Aqui no Brasil é a barba. Depois do Los Hermanos, todo mundo usa barba na crença de que irão fazer algo de qualidade. E é isso que me irrita no rock de hoje, pois se coloca mais ênfase na estética do que na música, o visual é legal para muitos, é “alternativo”, é “cool”, mas e a música? Cadê a qualidade? Se colocar em uma peneira os artistas de hoje, 70% se destacam pelas fantasias, pelos trajes diferentes, plumas e paetês, a música torna-se um detalhe ignorável nesse processo. Björk, Secos & Molhados, Kiss, David Bowie, são exemplos de que você pode se pintar, se maquiar, se travestir, desde que isso não comprometa sua qualidade musical. Arthur Dapieve escreveu em um artigo que: “techno, drum´n´bass, ambient, big beats, trip hop, lounge, essas tendências incestuosas que estariam matando o rock”, não concordo.[1] Não concordo porque o rock sempre conviveu muito bem com outras tendências e estilos, como o jazz rock dos anos setenta, a invasão dos sintetizadores nos anos oitenta, etc. Acho que o rock convalesceu por sua própria conta, não teve forças para se reinventar. Há também muita precipitação por parte da crítica, pois elegem de um dia para o outro uma banda como grande salvação do rock, ou como novos "Beatles", como gênios da música. Fiquei mais uma vez muito pasmo quando assistia ao VMB 2009 na MTV, e vi o Forfun ganhar o prêmio de melhor banda de rock e o Fresno artista do ano. É quase um insulto a tradição de bandas de rock no Brasil, começando com Raulzito e os Panteras, passando por Legião, Paralamas, Titãs, chegando no Skank, nos Los Hermanos. A qualidade dessas muitas bandas fez com que o rock no Brasil ganhasse alguma notoriedade, que saísse de um lugar subestimado onde a Jovem Guarda o havia colocado. O rock é um gênero que tanto totaliza como fragmenta. Punk, pop, harcore, metal, são sub-estilos dentro do rock, mas o elemento que liga todas as bandas que fazem algum tipo de rock é o fato de serem rock. Luis Fernando Verissimo disse que tanto a camisinha como a camisa de um clube de futebol, não distinguem craques de medíocres, pois ambos as vestem, eu digo o mesmo do rock, artistas medíocres e grandes artistas partilham do mesmo rótulo, artistas de rock.[2] Nomes como Renato Russo e a Legião Urbana, Cazuza e o Barão Vermelho ou os Titãs, podem ser colocados ao lado de Lucas do Fresno e Di do NX Zero. É um absurdo! Não é uma comparação de épocas, pois quem é bom continua sendo bom. O Herbert Vianna continua tão bom quanto nos anos oitenta. Sua qualidade não se alterou. O mundo que já saldou Smiths, hoje salda Fall Out Boy, o Brasil que já saldou os Mutantes, hoje aplaude o Strike. O cenário rock no mundo está muito decadente. É só pegar o VMA e ver quem domina as paradas. É só rap, pop e R&B de péssima qualidade. Dos poucos artistas de rock concorrendo, vê-se coisas como Paramore. O mundo do rock passa por uma crise tão grande já há algum tempo, que é necessário que grandes bandas voltem para mexer com o estilo. The Doors, Queen, Pixies, Alice In Chains e mais recentemente o Faith No More, são exemplos de bandas antigas que voltaram, dado o esgotamento do gênero. Poucas bandas de hoje se destacam pela real qualidade e pela honestidade, talvez o Arcade Fire, o Sigur Rós, ou o Beirut, ou até o Franz Ferdnand. Bandas que fazem um bom trabalho, sem muitos apelos estéticos ou pirotécnicos. A democracia digital também está contribuindo para a agonia do rock. Myspace e novas tecnologias, deixam o rock mais acessível a qualquer um, e em poucos segundos uma música que está sendo feita em Botsuana chega a gravadora Geffen nos Estados Unidos. Como disse Arthur Dapieve, “a web alarga o espaço para fenômenos localizados”, isso significa que, como no universo, estrelas nascem e morrer a todo instante, e no universo musical, essas estrelas não costumam ter tanta qualidade assim.[3] Como depender de um rock cuja a revelação é Cine? Como acreditar em novos tempos para esse estilo no Brasil? Existem boas bandas em território nacional, o próprio Móveis Coloniais de Acaju, e existem as muito aclamadas e só isso, como Vivendo do Ócio. Muitas outras bandas boas existem por aí, bandas que os festivais independentes como M.A.D.A., Abril pro Rock ou Goiânia Noise Festival revelam ano a ano. Mas a vitória de uma banda no grande cenário é como a luta dos milhões de espermatozóides para penetrar no óvulo, poucos conseguem. Veja o paradoxo. Porque a cena do rock gaúcho com tantas ótimas bandas não vingou e a cena Emo vinga até hoje? Porque não está em jogo a qualidade do que se faz, mas sim o seu potencial de lucratividade. E lucratividade nem sempre significa qualidade. Quem vende mais hoje no Brasil são os emos, e isso não faz deles grandes artistas. E essa mercantilização é que faz com a qualidade caia. Pois, muitos artistas mudam de estilo apenas para vender mais ou para conseguir bons contratos, implicando na queda da qualidade musical. É o que Camille Paglia sentenciou: “o rock não devia ser abandonado ás darwinianas leis do mercado”, mas está sendo.[4] O rock é uma forma de expressão atemporal, não vai morrer. O grande problema é que o rock não parece reagir a essa situação. Nem no Brasil e nem no mundo. Tudo que aparece já é alçado a revolucionário, extraordinário, magnífico, e na falta, qualquer paixão nos diverte. O futuro é muito incerto, não sabemos o que nos está reservado. A única coisa que posso dizer é que no presente a coisa está muito ruim, e a única receita para sair desse poço é buscar no passado referências e fazer leituras atuais, com novos instrumentos e novas formas de compor, pois se continuarmos imitando pura e simplesmente e tentando tirar coelho de cartolas, cairemos cada vez mais nas armadilhas do mercado e ficaremos pasmos com as atrocidades que ainda estão por vir.



[1] DAPIEVE, Arthur. Miúdos Metafísicos. Rio de Janeiro: Topbooks, 1999. p.92.

[2] VERISSIMO, Luis Fernando. A eterna privação do zagueiro absoluto. Rio de Janeiro: Objetiva, 1999. p.25

[3] DAPIEVE, Arthur. Qual o Futuro da música. Bravo. São Paulo, n. 139, p.32, março. 2009.

[4] PAGLIA, Camille. Sexo, arte e cultura americana. São Paulo: Companhia das Letras, 1993. p.31.






























































































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